3/29/2011

NOSFERATU — UMA SINFONIA DE HORRORES: O Dia Seguinte



Ver NOSFERATU — UMA SINFONIA DE HORRORES é assistir a um filme de vampiros quando esse género nem sequer existia. Pois esta é a história imaculada do Drácula antes de ser enterrada viva em lugares-comuns, paródias, anúncios de televisão, desenhos animados, cartoons e cerca de trinta outros filmes dedicados à personagem. Pois este filme revela-se maravilhado pelo material que adapta... Até parece feito por quem acreditava mesmo na existência de vampiros.

A interpretação de Max Schreck, no papel do vampiro, é exemplo perfeito disso, totalmente liberta dos toques teatrais que contaminariam as performances posteriores de Bela Lugosi, Christopher Lee, Frank Langella ou Gary Oldman. O seu vampiro surge como um ser afligido por uma maldição pavorosa e, fisicamente, quase despojado de qualquer semelhança humana.



Inspirado no romance de Bram Stoker, NOSFERATU — UMA SINFONIA DE HORRORES marca uma das primeiras adaptações daquela figura sanguinária na Sétima Arte (o primeiro registo da sua aparição será, provavelmente, LE MANOIR DU DIABLE, de Méliès) e revelou-se extremamente influente não só nas versões subsequentes de Drácula — o conceito da sua morte através da exposição à luz solar, ausente no livro, foi aqui introduzido pela primeira vez — como em toda a história do filme de terror.

[Para além da versão assinada por Werner Herzog, em 1979, com o título NOSFERATU: PHANTOM DER NACHT, Francis Ford Coppola reaproveitou muita da sua imagética em DRÁCULA DE BRAM STOKER (1992) e originou A SOMBRA DO VAMPIRO (2000), um interessante e (infelizmente?) fictício relato da produção de NOSFERATU, no qual Max Schreck é um vampiro autêntico "recrutado" por Murnau com o intuito de conferir maior veracidade ao seu filme.]



Muito deste legado deve-se à visão de F.W. Murnau. A concepção estética claramente associada ao Expressionismo Alemão, cujos elementos primários estão aqui exibidos (um cenário urbano decadente, a pesada maquilhagem que reforça o chiaroscuro, sombras tão ou mais sinistras que os indivíduos que as formam — já em 1922, muitos defendiam que uma maior exibição da silhueta do Conde Orlock torna-lo-ia ainda mais ameaçador), aumenta o sentido metafórico aqui impresso. De entre as várias interpretações que o filme suscitou, ninguém fica indiferente à abordagem a assuntos que preocupam a Humanidade de todas as eras (doença, loucura, morte) e NOSFERATU — UMA SINFONIA DE HORRORES sugere esses receios no seu próprio estilo visual: a bruma domina, as personagens espreitam ou acobardam-se, e é regra de composição que se cria maior tensão quando um sujeito é filmado fora do centro de um plano.

Será NOSFERATU — UMA SINFONIA DE HORRORES um filme assustador na acepção moderna do termo? Para mim, de maneira nenhuma. Admiro-o mais pela sua atmosfera que, noventa anos depois, ainda possui a mesma capacidade de assombrar o espectador. Não nos mostra vampiros que surgem repentinamente das sombras, mas revela que o mal pode anunciar-se em qualquer molde, seja ele vivo ou morto.

Samuel Andrade.

Nota: este texto reflete apenas a opinião do autor, não representando a visão geral do 9500 Cineclube.

3/21/2011

SESSÃO 59

::: CICLO CINEMA NO FEMININO :::

CURTAS DE AGNÈS VARDA - PARTE 2


Agnès Varda é uma das mais importantes cineastas da actualidade. Foi a autora de DUAS HORAS DA VIDA DE UMA MULHER (1961), um dos porta-estandartes da Nouvelle Vague, e desde aí vem flutuando livremente entre a ficção e o documentário, entre a curta e a longa-metragem.

Citando Agnès Varda: «Apesar de o seu cinema ter uma marca documental, carácter social e feminista, o seu maior combate no cinema é "fazer sempre algo de novo", sem perder o traço experimental, e transmitir emoções».

Parte II
. AS CURTAS TURÍSTICAS
O Seasons, O Chateaux... (1957) 21’
Pleasure of Love in Iran (1976) 6’
Coasting Along the Coast (1958) 26’

. CINEVARDAPHOTO
Ydessa, the bears and etc... (2004) 43’
Ulysses (1982) 21’
Hi there, Cubanos (1962-63) 28’

Hoje, pelas 21h30, no Cine Solmar

3/15/2011

OS DOIS DA (NOVA) VAGA — O Dia Seguinte


Mais didáctico que enciclopédico, OS DOIS DA (NOVA) VAGA constitui uma interessante abordagem à Nouvelle Vague, plenamente capaz de cativar iniciados e veteranos no tema, procurando imergir o espectador numa época social e cultural muito particular.

Como o título indica, o filme centra-se quase exclusivamente nas figuras e percursos de Jean-Luc Godard e François Truffaut, fazendo-o de modo quase exaustivo: dos seus primórdios enquanto críticos apaixonados por um estilo literário de análise fílmica até à sua célere ascensão a favoritos da crítica, a sucessiva permuta de argumentos e projectos, os seus perfis biográficos e, por fim, as razões que originaram a cisão criativa e pessoal dos dois autores. Episódios acompanhados por um apurado recurso a imagens de arquivo, recortes de imprensa (edições da Cahiers du Cinéma em destaque) e os obrigatórios excertos de OS 400 GOLPES ou O ACOSSADO como complementos da informação histórica partilhada.

Lamenta-se, contudo, que Emmanuel Laurent, juntamente com o argumentista Antoine de Baecque, não tenha tocado nas influências recebidas (Claude Chabrol ou Henri Langlois) e transmitidas (Louis Malle, Agnès Varda ou Alain Resnais) por Godard e Truffaut. A crónica da Nouvelle Vague revela-se incompleta em OS DOIS DA (NOVA) VAGA, tornando-o, assim, num título secundário para a compreensão do movimento.

E é impossível não referir o protagonismo conferido a Jean-Pierre Leaud no filme.


De face inconfundível da Nouvelle Vague até à sua utilização como "arma" da disputa artística e ideológica de Godard e Truffaut, pertence-lhe o instante mais delicioso de OS DOIS DA (NOVA) VAGA: as imagens (para mim, desconhecidas) da sua audição para OS 400 GOLPES durante os créditos finais.

E muitos questionam-se sobre a presença aqui conferida a Isild Le Besco, actriz francesa contemporânea. A resposta poderá ser encontrada no célebre axioma enunciado por Jean-Luc Godard: «Para fazer um filme, basta ter uma miúda e uma pistola». Emmanuel Laurent não apresenta qualquer género de arma mas a face de Le Besco, justaposta com as de Jean Seberg e Anna Karina, sugere um saudosismo que nunca fica mal a um documentário. Mesmo que tal seja apontado por outras vozes como "defeito estético"...

Samuel Andrade.

Nota: este texto reflete apenas a opinião do autor, não representando a visão geral do 9500 Cineclube.

3/10/2011

SESSÃO 57

::: SESSÃO ESPECIAL :::

OS 2 DA (NOVA) VAGA, de Emmanuel Laurent


Os 2 DA (NOVA) VAGA é a história de uma amizade. Jean-Luc Godard nasceu em 1930, François Truffaut dois anos mais tarde. O amor pelo cinema juntou-os. Escreveram nas mesmas revistas: Cahiers du Cinema e Arts. Quando o mais novo dos dois se tornou realizador com OS 400 GOLPES, que triunfou em Cannes em 1959, ajudou o velho amigo a entrar no mundo da realização, oferecendo-lhe um argumento que inclusivamente já tinha título: O ACOSSADO.

Durante a década de 60 apoiaram-se mutuamente, até 1968 altura em que a história e a política os separa: Godard envolve-se nas políticas revolucionárias e Truffaut continua o seu percurso artístico sem influências do contexto social e político. Entre os dois, estava Jean-Pierre Leaud, como uma criança filha de pais separados e desavindos. A amizade de Godard e Truffaut, bem como o seu afastamento, fazem parte da história do cinema francês.

Recorrendo a imagens de arquivo, a excertos dos filmes dos dois realizadores e folheando recortes de imprensa da época, OS 2 DA (NOVA) VAGA leva-nos de volta a uma década que transformou o mundo.



14 de Março (Segunda-Feira), pelas 21h30, no Cine Solmar

3/08/2011

FILME SOCIALISMO — O Dia Seguinte


Poderíamos deitar o nosso olhar mais subjectivo sobre FILME SOCIALISMO e de lá nada retirar.



Do ponto de vista técnico, não estamos perante nada de revolucionário: já Michael Haneke fez este tipo de experiência audiovisual nos anos 90 (O SÉTIMO CONTINENTE ou 71 FRAGMENTOS DE UMA CRONOLOGIA DO ACASO, só para citar dois exemplos flagrantes) com maior sucesso. A "narrativa", dividida entre a denúncia aos comportamentos de consumo da nossa era e a reflexão sobre o Século XX Europeu, pouco transmite.

A jovem insolente, que surge no segundo segmento do filme, parece personificar o Jean-Luc Godard representado em FILME SOCIALISMO perante os tempos modernos: impregnado duma ideologia suspensa no tempo, anacrónica, sem motivos de existir.



Para além da sua óbvia capacidade de suscitar debate, vale-lhe a indulgência reservada a autores do seu estatuto. Uma atitude que, para mim, chega a ser quase desrespeitosa. Ninguém retira a Godard o importante papel desempenhado em prol dos patamares artístico e teórico alcançados pela Sétima Arte, logo não seria necessário estar-se a formular "cartas de retractação" que o próprio cineasta (se bem o conhecemos...) rejeitaria subscrever.

Não se inventem argumentos para encontrar preciosos achados de semântica em FILME SOCIALISMO, nem se compare este título com a filmografia, antiga ou recente, do realizador. Olhemos para a obra, exibida ontem à noite pelo 9500 Cineclube de Ponta Delgada, tal como ela é: uma longa dissertação de um indivíduo cada vez mais determinado em não comunicar com a sua plateia.

Samuel Andrade.

Nota: este texto reflete apenas a opinião do autor, não representando a visão geral do 9500 Cineclube.

3/04/2011

SESSÃO 56

::: SESSÃO ESPECIAL (ESTREIA) :::

FILME SOCIALISMO, de Jean-Luc Godard


FILME SOCIALISMO é um filme dividido em três momentos: o primeiro ocorre num navio onde se fundem e entrelaçam várias histórias de viajantes de todas as partes do mundo; o segundo retrata o conflito familiar onde os progenitores são postos à prova; finalmente, o momento em que o realizador expõe as suas ideias sobre a Europa e o mundo contemporâneo.

Última longa-metragem de Jean-Luc Godard, estreada no último Festival de Cannes, é um ensaio sobre a Europa e o mundo.



07 de Março (Segunda-Feira), pelas 21h30, no Cine Solmar

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